A Federação Nacional dos Médicos (FNAM) participou na Comissão Técnica Nacional, no dia 31 de janeiro, para discutir a contratualização dos cuidados de saúde primários de 2023. Era suposto a reunião contar com a presença do Diretor Executivo do Serviço Nacional de Saúde, Fernando Araújo, que pôde estar presente devido a alterações de agenda de última hora.

A reunião, presidida pela Administração Central do Sistema de Saúde (ACSS) foi meramente informativa, tendo sido transmitido que a contratualização para 2023 irá ser igual à de 2022, sendo ainda acrescentado mais um indicador à área «segurança do utente», tornando este modelo cada vez mais complexo.

Perante estas informações, a FNAM alertou que estas orientações da ACSS afasta os médicos de família do trabalho clínico, limitando o cumprimento das suas tarefas assistenciais e o acesso dos utentes ao SNS.

Nas Unidades de Saúde Familiar (USF) e Unidades de Cuidados de Saúde Personalizadas (USCP), apenas 50% da avaliação de desempenho se refere a atividades clínicas (assistência direta ao utente). Os restantes 50% dizem respeito a atividades não estritamente clínicas – organização, auditoria, gestão de reclamações, gestão de risco, segurança, gestão de incidentes, formação contínua e produção de trabalhos científicos.

Estas atividades, cuja relevância é inegável, devem ser realizadas com apoio de profissionais não clínicos com formação especializada nas diferentes áreas (responsabilidade partilhada com os Agrupamentos dos Centros de Saúde e respetiva Administração Regional de Saúde) e a sua ponderação na avaliação deve ser reduzida para 30%, aumentando a proporção relativa ao trabalho clínico para 70%.

O volume de trabalho que todas aquelas atividades não clínicas, bem como o peso que a ACSS lhes atribui, desvirtua a verdadeira missão dos médicos com perda real de atividade clínica. É fundamental que os médicos de família tenham tempo para prestarem cuidados de saúde aos seus utentes, tempo esse que já é claramente insuficiente devido às listas sobredimensionadas. No atual contexto nacional de falta de médicos de família, a FNAM questiona esta decisão.

Além disso, a FNAM entregou um documento dirigido ao Diretor Executivo do SNS, denunciando o incumprimento por parte da tutela da aplicação dos incentivos institucionais, que são devidos às equipas de saúde, e que permitiriam a melhoria do contexto físico do exercício da medicina, bem como o reforço de competências formativas dos profissionais de saúde.

Não é possível atrair profissionais para a especialidade de Medicina Geral e Familiar quando a política atual afasta os recém-formados da atividade clínica, colocando um enfoque crescente na burocracia. O investimento do país na formação médica tem de ser considerado relevante e não pode ser desperdiçado na criação de tecnocratas com capacidade diagnóstica, desligados da prática humanizada da medicina.

A FNAM considera necessário e indispensável que a elaboração, desenvolvimento e aperfeiçoamento de indicadores de avaliação seja da competência de uma comissão técnica científica independente, evitando-se erros metodológicos e a criação de indicadores que pouco indicam sobre o que se pretende avaliar e valorizar. Estes indicadores, antes de serem integrados no processo de contratualização, devem ser discutidos com as instituições que representam os profissionais, monitorizados e comunicados previamente às equipas.

Os médicos de família devem fazer aquilo que aprenderam a fazer e no que o Estado Português investiu: prestar cuidados de saúde de qualidade a todos. Ter Médico de Família é um bem que deve ser salvaguardado e a premissa base do Serviço Nacional de Saúde.

Comissão Nacional de MGF da FNAM