O Serviço Nacional de Saúde tem de ter meios (logísticos/humanos) e ambição, para poder afirmar a centralidade no sistema nacional de saúde. Sendo de facto uma das grandes conquistas de Abril, não pode deixar-se emoldurar no estatuto fixista que o tem vindo a transformar numa espécie de “albergue espanhol”, onde todos cabem mas poucos zelam pelo seu aperfeiçoamento e afirmação.
Contra o vaticínio de alguns, o modo exemplar como se enfrentou e tem vindo a decorrer o plano vacinal anti—Covid são demonstrativos da capacidade de resposta do SNS às necessidades da população. Não se questionando o mérito atribuído à task-force vacinal e ao seu coordenador, há que reconhecer que sem o empenho e o sentido de dever público de todos os organismos envolvidos, não era possível superar as metas de vacinação inicialmente definidas levando a bom porto tão exigente tarefa.
A verdade é que quando os profissionais são valorizados e devidamente orientados, conseguem superar-se vestindo a camisola. Bem sei que é grande a diferença entre o sucesso no desempenho de uma tarefa ou numa atividade diária e continuada no tempo, como sucede com a “máquina” do SNS. Há, porém, em comum a exigência dos profissionais se identificarem com os objetivos e a missão do serviço público em causa.
É um facto que o SNS sofreu nos últimos anos tratos de polé. Não me refiro apenas ao subfinanciamento mas, não menos importante, a uma política laboral/salarial errática e à incapacidade politica em conduzir as reformas que se impunham e impõe (descrença?), deixando a dúvida sobre a continuidade do modelo ou de transição para um outro assente em seguros de saúde.
Que outra leitura permite o crescimento exponencial do setor privado onde, na área hospitalar, para além das PPP-Saúde, tende para representar 50% da atividade do País? Que entendimento pode ter a decisão do Governo de largar a ADSE aos funcionários públicos com contrato individual de trabalho, envolvendo cem mil trabalhadores dos quais sessenta mil exercem funções no Serviço Nacional de Saúde?
O progressivo afastamento dos grupos sociais com maior poder económico tem como consequência o empobrecimento do SNS. Não do ponto de vista financeiro, mas qualitativo, deixando-o como um serviço de saúde a cuidar de quem não tem alternativa. Prova da contínua debilidade é a aquisição crescente de bens e serviços ao privado. Sendo esta uma realidade, é preciso perceber porquê e tomar medidas que minimizem o recurso ao outsourcing.
A internalização dos meios complementares de diagnóstico aliada ao aprofundamento da contratualização interna, é uma das medidas que pode contribuir para o reforço do SNS ajudando a fixar profissionais evitando o seu esvaimento. Contudo, não é suficiente para reter os mais qualificados no serviço público de Saúde em outras áreas do conhecimento.
Bem sabemos que em política é mais fácil satisfazer clientelas que tomar decisões que vão ao encontro do interesse geral. Porém, evitar o debate alargado em Saúde, nomeadamente que serviço público queremos e como vamos financiá-lo, continuando a alimentar incertezas, só pode conduzir a maus resultados futuros.