No início do penúltimo dia do concurso para o Internato de Formação Especializada confirma-se o que a FNAM tem denunciado: o Serviço Nacional de Saúde (SNS) está a perder médicos porque o governo não lhes dá condições para ficar. Das 2331 vagas abertas765 ainda estão por preencher, um número que não é apenas preocupante: é uma demonstração clara da falta de vontade política do governo de Luís Montenegro e da tutela de Ana Paula Martins em tornar as condições de trabalho dos médicos internos atrativas.

As vagas abandonadas concentram-se exatamente nas áreas estruturantes que permitem o funcionamento do SNS:

  • 386 vagas em Medicina Geral e Familiar (56%), que representam 51% de todas as vagas sobrantes.
  • 132 vagas em Medicina Interna (65%)
  • 51 vagas em Patologia Clínica (91%)
  • 42 vagas em Saúde Pública (70%)
  • 37 vagas em Medicina Intensiva (50%)
  • 17 vagas em Medicina de Urgência e Emergência (55%)

A região de Lisboa e Vale do Tejo é a mais afetada, que continua incapaz de fixar médicos porque o governo oferece vagas no papel, mas recusa oferecer condições no terreno. O resultado está à vista: equipas por completar, serviços em rutura e centenas de médicos que são afastados  do SNS como opção de futuro.

A realidade é ainda mais grave: 283 dos 2375 candidatos — 12% — já rescindiram com o SNS. Não se trata de um detalhe estatístico, trata-se de um aviso sério. Estes médicos desistiram antes de sequer escolherem especialidade, porque o SNS lhes oferece precariedade, sobrecarga e ausência de perspetiva de carreira. É este governo que está a empurrar médicos para fora do serviço público.

Os médicos internos representam 11 mil profissionais, um terço dos médicos do SNS, e sustentam diariamente serviços inteiros — muitas vezes sozinhos em urgências, expostos, desprotegidos e obrigados a assumir responsabilidades que não correspondem ao seu estatuto. Em vez de proteger estes profissionais, o governo mantém-nos fora da carreira médica, numa posição laboral indefensável.

A situação não é nova, mas piorou. Um estudo da Ordem dos Médicos, publicado em 2023, já demonstrava que 25% dos internos estavam em burnout e 55% em risco. O alerta era claro, os números eram públicos e a urgência estava identificada. O governo atual nada fez para inverter esta realidade.

Os médicos não rejeitam o SNS. O SNS, pelas mãos do governo, é que está a rejeitar os seus médicos. Com salários baixos, formação insuficiente, horários desumanos e ausência de carreira, não há propaganda capaz de convencer uma geração exausta a permanecer.

Perante este cenário, a FNAM exige medidas imediatas: a reintegração do Internato Médico como primeira categoria da carreira médica; a valorização do médico interno como trabalhador e formando com condições dignas e formação de qualidade; a criação de um fundo de formação que garanta acesso a cursos, congressos e produção científica; a atualização dos apoios à mobilidade e alojamento e o cumprimento rigoroso da lei laboral por todas as instituições.

A FNAM já enviou uma missiva formal à Ministra Ana Paula Martins e à ACSS, exigindo a revisão urgente do regime e regulamento do Internato Médico e medidas concretas para travar a destruição em curso. Cada dia sem resposta é mais um dia a perder médicos no SNS.