Não é uma epidemia vírica que faz soçobrar o Serviço Nacional de Saúde. Há que
reconhecer que a dissimulação do inimigo tem causado enormes problemas na resposta
assistencial, que o conceito de imunidade de grupo (70%, 90% de vacinados, será
alcançável?) tem vindo a mudar com a evolução e a tenacidade do agente infetante…
Porém, há que concordar que os profissionais do SNS têm estado à altura da exigência
sanitária, em particular no cumprimento do indeclinável plano vacinal.
Numa autêntica corrida contra o tempo, a meta das 100 mil vacinações diárias,
estabelecida em abril último pelo primeiro-ministro, tem vindo a ser largamente superada
pelas equipes no terreno definidas pela task force vacinal, cujo empenho e competência
ninguém contesta. Neste trabalho estrénuo, há que destacar o papel dos profissionais dos
Centros de Saúde, em especial do setor de enfermagem a quem compete, no essencial, a
preparação e administração das vacinas.
A sobrecarga de trabalho exigida aos Cuidados de Saúde Primários pode ser, direi mesmo
deve, aliviada envolvendo os profissionais dos Hospitais do SNS nas equipes de
vacinação. A capacidade logística e a disponibilidade de recursos humanos demonstradas
para imunizar os seus profissionais em período de maior pressão infeciosa não
desapareceram, nem esmoreceu a vontade de cooperar no combate ao inimigo comum.
O maior problema em acelerar a vacinação, pesem todas as dificuldades, não está na falta
de recursos humanos no SNS, mas em haver vacinas disponíveis para a população
elegível no espaço de tempo que temos à nossa frente. Este é um problema real, que pode
pôr em causa o objetivo de termos 70% da população vacinada com uma dose entre 8 e
15 de agosto e com a vacinação completa entre 5 e 12 de setembro, como alertou o vicealmirante Gouveia e Melo.
Depois da falha inicial da Astra-Zeneca em cumprir o número e ritmo de entrega de
vacinas, é agora a Janssen a claudicar. Das 600 mil unidades acordadas para agosto,
apenas 200 mil devem ser entregues. Carência que pode ser colmatada pela cedência de
mais vacinas da Pfizer por outros países da União Europeia. Entretanto o dossiê da vacina
Sputnik continua a amarelecer na Agência Europeia do Medicamento e as prometidas
vacinas Covid da Sanofi Pasteur tardam em ver a luz do dia.
Tendo em conta esta realidade, parece-me secundária a polémica em torno da capacidade
de resposta do SNS ou do alargamento da vacinação aos mais jovens sem problemas de
saúde. Face à previsível carência de vacinas, arriscamo-nos a que nem os grupos de
reconhecido risco beneficiem em tempo útil da proteção vacinal, enquanto vamos
discutindo questões laterais esquecendo o que mais interessa.