Estamos a viver a 5ª vaga da pandemia Covid-19 em Portugal, prevendo-se um significativo aumento da incidência, nas próximas semanas e meses.

Mais uma vez, a sociedade portuguesa e, em particular, o Serviço Nacional de Saúde (SNS) está perante um enorme desafio.

O desafio para o SNS é ser capaz de uma resposta integrada e eficiente à pandemia, sem pôr em causa a resposta a outras necessidades de saúde, também prioritárias, sob pena da doença grave e a mortalidade que evitarmos por Covid-19 ser ultrapassada pelas outras doenças e pela mortalidade geral.

Prevendo-se, mais uma vez, que a grande maioria dos casos de Covid-19 serão ligeiros a moderados, e ainda mais agora na fase pós-vacinação, a responsabilidade do seu acompanhamento não deve e não pode ficar à exclusiva responsabilidade dos profissionais dos Cuidados de Saúde Primários (CSP), em particular dos médicos de família, designadamente com os recursos atuais.

O SMN teve conhecimento de orientações da Administração Regional de Saúde (ARS) do Norte para que as Unidades reduzam a sua atividade programada (consultas e todas as atividades afins) em 30-50% nas próximas semanas. Se o Ministério da Saúde (MS) e a ARS Norte dão estas instruções, exige-se que o assumam publicamente e de uma forma clara, para que o “odioso” do problema e da decisão não caia, mais uma vez, em cima dos profissionais de saúde. Como seria expectável, os utentes mantêm uma procura por cuidados muita intensa e, legitimamente, não só reclamam por uma resposta mas também por prazos cumpridos. Ora, apesar de toda a abnegação e das muitas horas de trabalho extraordinário que continua a ser realizado, em grande parte não reconhecido e não remunerado, não é possível dar resposta atempada ao enorme volume de solicitações e acabam por ser os médicos no terreno, exaustos e alheios da responsabilidade destas decisões superiores, o alvo injusto da insatisfação geral.

Por outro lado, a eventual interrupção de parte muito significativa e decisiva da atividade dos CSP, programada e não programada, compromete drasticamente os cuidados de saúde prestados à população geral, nomeadamente, a idosos, a doentes com multimorbilidade crónica, com diabetes e/ou hipertensão arterial, os rastreios oncológicos, etc., prejudicando-se gravemente a acessibilidade a este primordial nível de cuidados.

O seguimento dos casos suspeitos ou confirmados de Covid-19, a vacinação Covid-19 e toda a atividade programada e de consulta aberta nos CSP exige mais recursos, mais médicos e, ainda, uma mobilização geral do conjunto do SNS, do setor privado e social.

A importância e necessidade da contratação de profissionais para assegurar as atividades Covid tem sido reconhecida e anunciada publicamente pelo Ministério da Saúde, mas a realidade indica que, apesar de localmente estarem identificadas as necessidades e de existirem recursos humanos disponíveis (médicos reformados, sem contrato com o SNS, etc.), a sua contratação continua a ser recusada pela Administração. Exige-se ao MS e à ARS Norte que regularize e proceda ao desbloqueio de todas estas situações e contrate estes profissionais, devolvendo aos profissionais dos CSP o tempo fundamental para prestarem cuidados de saúde aos seus utentes, tempo esse que já era insuficiente antes da pandemia devido às listas sobredimensionadas.

Os cuidados de saúde de proximidade e essenciais não podem “fechar”, não podem e não devem ser reduzidos. Para além de constituir uma violência e uma privação de direitos para a população, em particular para as camadas mais frágeis e carenciadas, tal restrição virá a ter impacto negativo no seu sofrimento, na morbilidade e na mortalidade geral.

Salienta-se ainda que, os CSP, pelas suas características de proximidade, acessibilidade, globalidade, continuidade e confiança mútua, são e devem ser considerados essenciais e prioritários, sendo quase impossível “fechar” e obrigando os profissionais e as equipas a trabalharem cada vez mais – mas isto tem um limite! Esse limite já foi ultrapassado!

Há que estabelecer e assumir publicamente a priorização das atividades nos CSP.

Há que recrutar mais recursos humanos, nomeadamente médicos, enfermeiros e assistentes técnicos.

Há que mobilizar todos os recursos do SNS para a necessária resposta. Há que remunerar devidamente os profissionais e todo o trabalho suplementar.

Há que simplificar e automatizar procedimentos num sistema de informação “amigo do utilizador”.

A Direção do SMN

Porto, 23 de dezembro 2022